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JORNAL
LEIA LIVROS - Nº 29
São Paulo, OUT/NOV/1980
O INSÓLITO TEZZA
MILTON JOSÉ DE ALMEIDA
A cidade inventada,
de Cristovão Tezza. CooEditora, 136 pp.
A vocação para a produção de contos
parece ser generalizada entre escritores brasileiros. Desde a
obra de Machado até os contemporâneos, os contistas
têm oferecido material em quantidade para as infindáveis
digressões acadêmicas sobre a especificidade do conto.
Utilizando-se de situações insólitas, de
súbitos aparecimentos de personagens e muitas vezes, seus
inexplicáveis desaparecimentos, por locais nem sempre localizados
e sem ligar muito ao tempo, o autor cria narrações
que estão sempre a um passo do impossível, do fantástico.
Dessa maneira, quer ele oferecer uma visão de vidas em
degradação constante, incomunicáveis e desorientadas.
Como conseqüência (e o título informa), a civilização
como está não serve mais, é necessário
reinventá-la. Se lermos os contos até este nível,
ficaremos contentes, pois eles nos convencem; seus conteúdos
são plenos de casos humanos que, por serem "quase"
estranhos, nos revelam suas realidades. E tudo elaborado numa
linguagem muito correta, boa de se ler, fácil, com descrições
enxutas e desenvolvimentos ágeis. Se formos mais adiante,
mais a fundo, tentando buscar na obra o seu tempo histórico,
notaremos que ele nos mostra um universo tipo "fim-dos-tempos",
um mundo desencantado, fechado nos individualismos, que reproduz
fielmente a perspectiva estreita dos seres encerrados nos cárceres
urbanos. Nesse caso, a obra não acrescenta nada ao leitor,
a não ser a sua própria identificação,
e a saída para o nada. Ele passa a representar um produto
desse pensamento superficial do indivíduo alienado na nova
cidade desumana. O ator oferece ao leitor um espelho de boa qualidade,
de reflexos inusitados, mas somente uma fuga para dentro de si.
Tal visão é fruto de uma ótica individualista
que, por perder a visão do todo, enxerga a sociedade como
uma soma de indivíduos, cujos relacionamentos são
fortuitos e ocorre por encontros casuais guiados pelo acaso.
Dessa maneira, em A Cidade Inventada, temos um rodar de
temas ligados a mulheres, prostitutas que levam homens desprovidos
de vontade, ao casamento transgredido, às lembranças
da infância, aos conflitos individuais, ao desentendimento
entre amantes, e até ao problema da literatura e seu conceito.
Os contos de Tezza dão a impressão de ensaios para
projetos mais profundos, como um músico que toca aquelas
peças de praxe, que apesar de simples, mostram a qualidade
do instrumentista. Esperamos que ele chegue a nos dar um concerto.
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