Boas perguntas
Folha de S. Paulo, 22/05/2010

Depois da teoria, de Terry Eagleton

Fazendo mais perguntas do que dando respostas, a obra de Eagleton é uma viagem útil ao pós-modernismo

CRISTOVÃO TEZZA

EM "DEPOIS da Teoria - Um Olhar sobre os Estudos Culturais e o Pós-Modernismo", o pensador inglês Terry Eagleton diz que o realismo "talvez tenha se provado a forma cultural mais resistente na história ocidental".

Essa arte que espelha um mundo reconhecível teria suas raízes "profundamente entranhadas no psiquismo ocidental". A afirmação dá uma medida simbólica desta obra de 2003, relançada agora. Eagleton retoma os tópicos do que ele chama de "idade de ouro" da teoria cultural, a geração que se criou na efervescência dos anos 50 e 60 e ainda reverbera no horizonte.

Nomes como Lacan, Lévi-Strauss, Foulcault, Barthes, Althusser e tantos outros, a partir de uma raiz estruturalista, criaram e alimentaram a nuvem teórica em que se abriga a ideia de pós-modernidade.

Numa síntese grosseira, o Pós-Modernismo é a crítica radical ao próprio conceito de realismo que estaria na alma da cultura ocidental. Em suas versões mais exacerbadas, tal "princípio de realidade" poderia até ser entendido não como um erro histórico ou contingente do nosso olhar, mas como um defeito a ser corrigido na espécie humana.

Fazendo mais perguntas do que dando respostas, a obra de Eagleton, um pensador de filiação marxista, é uma viagem útil, frequentemente bem-humorada, às linhas gerais do pós-modernismo.

O livro repassa a importância da própria ideia de teoria e as perdas e ganhos da pós-modernidade; discute o conceito de moralidade, a clássica oposição entre o peculiar e o universal, e faz um belo ensaio sobre o espírito fundamentalista. Ao final, especula sobre a morte, "tão estranha quanto íntima para nós".

No capítulo sobre a noção de verdade, desmonta alguns alicerces da mitologia relativista pós-moderna e discute os conceitos de fundamento e moralidade.

A relação entre história, economia e pensamento está sempre presente na lógica de seu olhar; e, seguindo a trilha aberta por Herbert Marcuse (1898-1979), filósofo que marcou os anos 1960, há uma clara intenção de fundir a perspectiva marxista com as descobertas de Freud.

É também visível a clássica idealização da pobreza ("os miseráveis avaliam melhor a verdade da história humana"), uma recorrente síndrome europeia. O interessante é que, em momentos, essa fusão entre economia e pensamento cria paradoxos irônicos. Ao assinalar que "valores absolutos", como Deus, liberdade, pátria e família, são garantias de estabilidade, mas também prejudicam os lucros, pressupõe que o jovem rebelde das barricadas de 68 que detonou esses valores (e tudo que surgiu depois de Nietzsche) estava, de fato, apenas abrindo caminho para o devorante capitalismo global.


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