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GAZETA MERCANTIL - PARANÁ
Curitiba, 30 de dezembro de 1999
"Tenho compulsão com a palavra
escrita"
Marci Ducat, de Curitiba
A disciplina espartana com que Cristovão Tezza escreve
seus romances ("um poeta pode fazer uma obra-prima na mesa
de um bar, mas nunca um prosador") também está
registrada em um canto da biblioteca. A prateleira ainda guarda
dezenas de livros usados na pesquisa para escrever Breve Espaço
Entre Cor e Sombra. Além da ação urbana
protagonizada pelo pintor Eduardo Tato Simmone, o livro traz um
turbilhão de descrições e análises
sobre obras dos artistas plásticos Picasso, Goya, Piet
Mondnan, Degas e Modiglianí, só para citar alguns.
"Eu diria que tenho compulsão com a palavra escrita.
Tenho que estar sempre às voltas com livros, textos",
explica. No último ano, o escritor se debruçou sobre
um trabalho acadêmico pesado, nos preparativos para sua
tese de doutorado que cursa na USP. Tezza escolheu a teoria da
linguagem do russo Mikhail Bakhtin, assunto que deverá
tomar todo o seu tempo nos próximos dois anos. Para mergulhar
nos meandros da obra do filósofo, o autor também
se afastou temporariamente da Universidade Federal do Paraná,
instituição onde leciona Língua Portuguesa
desde 1986.
Apesar de se dizer escritor "desde sempre", ele admite
que, infelizmente, os livros ainda não mantém o
sustento de sua família. "Eles dão um dinheirinho
extra, mas o professor ainda alimenta o escritor", conclui
o romancista que já passou pelo teatro, fez estágio
como relojoeiro e foi até para o Acre, trabalhar com o
irmão num escritório de advocacia e dar aulas em
cursinho. Mas que escolheu a literatura, e só a literatura,
como seu refúgio existencial.
Gazeta Mercantil Paraná - Como você recebeu esta
última premiação? O que um prêmio literário
acrescenta de concreto à carreira do escritor?
Cristovão Tezza - Foi absoluta surpresa, porque
a gente não se inscreve. A Biblioteca Nacional que escolhe,
do depósito legal. Todas as edições catalogadas
concorrem, nas categorias romance, poesia e ensaio, e as bancas
selecionam. Este foi o meu presente de Natal, de um ano atrás,
quando terminei o livro. Respondendo à segunda pergunta,
um prêmio não nos acrescenta objetivamente nada.
Eu já participei de tantos prêmios, já perdi
tantos... Eu nunca dei muita bola para concurso. A grande vantagem,
para quem está começando, é a possibilidade
de edição do livro, que pode ser facilitada com
um prêmio. O próprio Ensaio da Paixão foi
publicado porque eu tinha ganho uma menção honrosa
no Prêmio Cruz e Souza, em 85. Só este fato já
facilitou a edição. Fora isso, é uma loteria.
Mas, no caso do Breve Espaço, teve um gostinho legal.
GZMP - Então o seu livro preferido é sempre
o último que você escreveu? Ou existe aquele que
você deseja sempre "repetir"?
CT - É, no meu caso é mesmo sempre o último...
Breve Espaço, por exemplo, é agora o meu livro predileto.
Do ponto de vista de visão de mundo, é a obra mais
complexa. Ele articula algumas estruturas básicas romanescas
que eu sempre usei, como a duplicidade, que veio do Trapo,
Juliano Pavollini, O Fantasma da Infância. Eu levo
isto às últimas conseqüências. Eu também
arrisquei mais. Tem a personagem italiana, uma carta escrita em
primeira pessoa. A questão das artes plásticas,
a reflexão sobre pintura - na verdade, mais um "gancho"
para eu falar de literatura. A composição dele também
é mais complexa, é uma síntese da minha literatura
anterior.
GZMP - Mas você não chega ao extremo de dizer,
como alguns escritores, que desejaria apagar ou esquecer o que
escreveu na juventude...
CT - Eu prefiro não ler. Mas tem uma fase de aprendizado,
obrigatória. Os contos de A Cidade Inventada eu
acho interessantes, e foi o meu primeiro trabalho de fôlego,
ao longo dos anos 70. Foi um dos meus primeiros textos mais maduros
(o livro foi lançado quando o escritor tinha 23 anos de
idade). Quando leio, acho que tinha um impulso de escritor muito
bom, mas pouquíssima técnica. Eu sinto que estão
mal escritos, mal resolvidos. Mas é um exercício.
GZMP - Mas quando nasceu o escritor?
CT - O escritor se faz antes mesmo de começar a
escrever. Mas, um outro livro de juventude meu, Gran Circo
das Américas, é uma narrativa linear bem simplória.
Acabou sendo uma prática narrativa, de como contar uma
história. Mas, eu reconheço, era uma literatura
fraca. N' O Terrorista Lírico, começo a entrar
com mais ambição, com uma questão psicológica,
o livro é mais fragmentário. Mas também é
um livro que se ressente de uma fraqueza técnica. O tema
era maior que o escritor. Com o Ensaio da Paixão
eu comecei a ficar mais "em pé", digamos assim.
A minha literatura começa a se equilibrar nesta relação
entre o que eu quero fazer e o resultado.
GZMP - Você percebe de que modo o amadurecimento de
seus textos?
CT - É sutil. Na verdade, o que amadurece é
a visão de mundo. Eu percebo, hoje, uma relação
sensível entre observação e o que eu tenho
à minha volta. Hoje, percebo que os fatos são muito
mais complexos e profundos do que eram há dez anos. Não
é só questão de técnica.
GZMP - E foi justamente há dez anos que você
lançou Trapo. Você esperava a grande repercussão
do trabalho, que lhe deu projeção nacional e que
hoje é adotado por vários concursos vestibulares
e cursos de literatura no Brasil? Com certeza, não está
entre seus livros mais complexos...
CT - Foi absolutamente surpreendente. Eu escrevi Trapo
em 82, logo depois do Ensaio da Paixão. Foi um livro que
correu o Brasil todo, eu recebi umas 30 recusas de editoras para
publicá-los, perdi todos os concursos em que entrei. Só
em 88, seis anos depois, que a Brasiliense resolveu publicá-lo.
E estourou, como crítica. Eu nunca havia sido notícia.
Curitiba, naquele tempo, era ainda pior do ponto-de-vista de recepção
da produção local. Subitamente, saíram matérias
na Veja, no Jornal do Brasil, no Globo. E, pouco a pouco, o livro
foi ganhando leitores. Ganhou montagem de teatro, foi adotado
pela Universidade Federal de Santa Catarina, pela Universidade
Federal do Paraná, da Unioeste. E tem uma relação
forte com o leitor jovem. Hoje, ele está na sexta edição,
vendeu 15 mil exemplares. Não é um número
tão expressivo quanto a repercussão do livro. Mas
a "piazada" continua lendo, eles se identificam muito
com o Trapo.
GZMP - A reedição do Ensaio da Paixão
(livro escrito há duas décadas e relançado
neste ano pela editora Rocco), que trata de todo o imaginário
dos anos 70, acompanha a estratégia de mercado, esta onda
revival daquela época, que volta com tudo na música,
moda e até mesmo na literatura?
CT - Não, isto já havia sido negociado, foi
meio por acaso. Para escrever Breve Espaço Entre Cor
e Sombra, eu precisava ir para a Itália, passar um
mês. Aí eu negociei com a editora Rocco os direitos
de edição, em troca da passagem de ida e volta.
Ajudou a terminar o livro, que já estava atrasado e ficou
pronto agora, em 99.
GZMP - Você falou da Curitiba de alguns anos atrás,
que dava ainda menos valor a seus produtores culturais. Você
sente isto ainda hoje, para usar uma palavra bem batida, esta
"autofagia" de que tanto se fala?
CT - Eu sinto esta dificuldade. Curitiba vive uma solidão
medonha. Especificameflte na literatura, não temos ainda
uma editora importante, que tenha reflexo nacional. O jornalismo
daqui é extremamente oficial, de um oficialismo que transcende
a questão cultural. Falta um jornalismo mais autônomo
e independente. Há uma relação muito forte
com o Estado, naquela ideologia do "somos uma grande família",
que é uma coisa mentirosa e terrível. Sem contar
a solidão. Se você não vai para São
Paulo ou Rio, se não faz uma ponte para fora, está
condenado mesmo a desaparecer.
GZMP - Mas como explicar, por exemplo, que um estado como
o Rio Grande do Sul, que está afastado dos grandes centros,
tem nomes como Érico Veríssimo, seu filho Luís
Fernando Veríssimo, Mário Quintana, entre outros?
CT - Mas o Rio Grande do Sul tem historicamente uma autonomia
imensa. Em Porto Alegre, é impressionante a vida cultural.
O Paraná é um Estado muito novo, é tudo muito
recente. A história do Rio Grande vem de longe, com suas
revoluções e episódios históricos
pelos quais o Paraná não passou. E Curitiba, particularmente,
parece ser mais nova ainda. Mas há muitos Paranás.
Existe uma efervescência muito mais forte, por exemplo,
no Norte do Estado. Em Londrina ou Maringá. Aqui, tudo
é mais conservador, isolado e fechado. O que eu sinto é
a solidão curitibana. Nós não conversamos
com o resto do País, isto é muito ruim. Ficamos
em volta do umbigo, o tempo todo.
GZMP - Mas, ao mesmo tempo, você guarda uma imagem muito
carinhosa de Curitiba, que passa em seus livros...
CT - Claro, estas críticas são simplesmente
em relação à super-estrutura. Porque hoje,
qualquer processo civilizatório de cultura tem que passar
pela imprensa, pela informação. Temos que analisar
qual é o lugar do jornalismo na sociedade, para se entender
a natureza da notícia. Neste sentido, nós levamos
azar. Agora, é uma cidade magnífica. Eu vivo há
40 anos aqui, acho que é a melhor cidade do Brasil para
um escritor. Ela é disciplinadora, para um escritor isto
é muito importante, pelo menos para o prosador. O poeta
consegue escrever uma obra-prima numa mesa de bar, o romancista
não.
GZMP - Você não sai muito de casa. Não
encontra muitos atrativos na cidade, fora do seu apartamento?
Isso tem a ver com a disciplina do escritor?
CT - Tem um certo jeitão de Curitiba, que é
a alma da cidade, que a gente não sabe explicar bem, um
certo germanismo. Eu acho interessante. Depois, tem o aspecto
do Brasil diferente. Como dizia o Wilson Martins, você não
encontra aqui um Brasil típico, baiano, carioca ou mesmo
o gaúcho. Tem uma coisa não muito definida, que
é muito tipicamente nossa. Eu sintetizaria de duas formas:
o máximo de olhar crítico com o máximo de
timidez. Uma combinação explosiva. O Dalton Trevisan
é exatamente isto, o limite destas duas características.
GZMP - Você é mesmo essa pessoa tímida
que as pessoas dizem, ou começa a se formar um mito, como
este relacionado a Dalton Trevisan?
CT - É verdade. É por isso que sou professor.
Porque como professor eu sou autorizado a falar para os outros,
tenho autorização oficial e sou pago para isso...
Tenho a desculpa de que sou obrigado a falar... Acho que tenho
uma timidez curitibana.
GZMP - Esta introspecção o levou a escrever
e ler mais?
CT - Não necessariamente. É uma questão
de temperamento. Se bem que acho que sou razoavelmente expansivo,
apesar da timidez.
GZMP - Em A Suavidade do Vento, o personagem central,
que por coincidência ou não é um escritor,
comenta: "Quem lê o texto soturno, às vezes
sinistro, jamais diria que o autor é um animado escritor
de 38 anos...". O que, na verdade, suas obras têm de
autobiográfico? O próprio Trapo, em algum sentido
tem muito do Cristovão Tezza jovem.
CT - Toda obra tem toques autobiográficos. Eu nunca
tive personagens fundamentados em pessoas reais. Exceto no Ensaio
da Paixão, que eu fiz para o pessoal que trabalhava
no teatro. Há amigos meus que eu transformei em personagens.
Foi o único momento em que isso aconteceu, objetivamente.
Mas o personagem é um Frankenstein, ele acaba sendo uma
figura autônoma. Por exemplo, o primeiro capitulo do Juliano
Pavollini tem muito a ver com minha infância. Do ponto
de vista biográfico, não tem nada a ver, mas a ambientação
e a visão de mundo, sim. É claro que jamais teria
escrito Uma Noite em Curitiba se não fosse escritor
e professor universitário.
GZMP - Apesar de ter passado parte da infância em Lages,
Santa Catarina, você é um curitibano típico...
CT - Sou um curitibano completo. Saio daqui e em dois dias
quero voltar correndo. Não sairia daqui por nada, vou morar
aqui pelo resto da vida.
GZMP - E quais são as suas memórias da infância
em Lages?
CT - Vim para Curitiba em 59, quando morreu meu pai. Dizem
que o escritor é feito na infância. Eu tenho memória
muito forte desta época, mas não vinculada necessariamente
a Lages. A cidade não tinha nada muito específico
ou típico. De certa forma, era abstrata como Curitiba.
A maior lembrança é o choque da morte do pai. Mas
talvez este meu pé fora da cidade me dá um olhar
suplementar para ver Curitiba, que muitos daqui não têm.
GZMP - E a juventude em Curitiba?
CT - Eu lembro de um rapaz bastante revoltado, bastante
marginal. Tive a sorte de estudar num colégio magnífico,
o Colégio Estadual. Aos 14 anos comecei a fazer teatro,
em 68. Na primeira peça da Denise Stoklos, eu fui o sonoplasta.
Viajamos para lrati, Ponta Grossa. Era um bando de loucos.
GZMP - Bem ao estilo dos anos 70, que você carrega até
hoje.
CT - Eu sou integralmente alguém dos anos 70. Eu
tinha um projeto intelectual, mas existencial ao mesmo tempo.
Esta coisa pragmática e objetiva que vemos hoje, do produto
cultural como um produto qualquer é totalmente avessa ao
espírito do meu tempo. Não bastava ser artista ou
fazer um produto. Você tinha que ser artista 24 horas por
dia. Usar o cabelo comprido, recusar o sistema, viver na madrugada
etc.
GZMP - Mas é um projeto que pode ser viabilizado hoje?
CT - Não, não tenho esta ilusão. O
mundo mudou, inclusive ficou mais perigoso. Havia uma certa tranqüilidade,
aqueles eram tempos quase idílicos. Falava-se de maconha
como se fosse a coisa mais natural do mundo, paz e amor. Mas hoje,
o que se tem são redes de narcotráfico, uma violência
brutal. A questão da cidadania é mais relevante.
E os anos 70 no Brasil coincidiram com a ditadura militar, era
uma dupla contestação. Contestávamos o sistema
e a legitimidade do poder. Ser marginal era uma forma de não
ter nada a ver com o que está aí. Era a resposta
que podia se dar para a ditadura. O poder era ilegítimo,
então nós nos sentíamos legitimados para
ser contra tudo. Isso, de certa forma, emburreceu um pouco o Brasil,
porque se criou a dicotomia. E hoje o mundo é muito mais
complexo, não dá mais para se trabalhar desta forma.
Com o fim da ditadura, esta polarização se fragmentou.
GZMP - Mas você também é saudosista com
relação à intelectualização
dos jovens desta geração?
CT - Sempre que se fala da diferença de gerações,
devemos observar a democratização do acesso à
informação. Eu estudei em um colégio magnífico,
o Estadual, mas quantos tinham acesso a isto, naquele tempo? Era
uma elite. Existiam muito mais analfabetos, muito mais gente fora
da escola, nos anos 70. Hoje, o acesso ao ensino piorou, mas há
uma democratização da informação inegável.
E isto muda todo o critério de análise. A força
da televisão, da lnternet. Eu me recuso a fazer aquele
discurso dizendo "no meu tempo que era bom". Temos que
olhar a nova geração com novas maneiras de olhar
o mundo.
GZMP - Por que você ainda escreve a mão os seus
romances?
CT - A primeira versão é sempre a mão.
Porque eu tenho um certo compasso do texto, e não tenho
pressa. E ao mesmo tempo acho mais fácil para manusear
as folhas, quando quero voltar, para reler, é mais rápido
que no computador. Agora, da segunda versão em diante é
no computador. A minha filha diz que eu sou um "nerd".
Adoro computador, vivo mexendo em novos programas. Agora, para
escrever ficção e literatura, prefiro fazê-lo
a mão. Tenho uma relação artesanal com este
trabalho.
GZMP - Você navega muito na lnternet?
CT - Bastante. Basicamente, para colher informações.
E acho a rede a maior revolução do final do século.
É a biblioteca universal.
GZMP - E a sua ligação com o meio acadêmico
também é forte. Você deixou de lado a sua
literatura, para se dedicar à tese de doutorado. Como estão
os trabalhos, quando o escritor volta à ativa?
CT - Estou trabalhando na teoria do pensador russo Mikhail
Bakhtin. O filósofo viveu neste século, mas sua
obra ficou desconhecida praticamente até os anos 70. Eu
gosto muito da teoria da linguagem dele. Há um ano eu comecei
as disciplinas, na USP. Estou me programando para escrever a tese
em março. Eu queria mesmo dar um tempo na ficção.
Tem gente que faz bem, consegue fazer de manhã uma tese
e à tarde um romance. Eu não consigo repartir a
cabeça, tem que ser uma coisa de cada vez. Quero ver se
nos próximos dois ou três anos eu acabo minha tese.
Eu brinco que vou começar a escrever no dia 2 de março
de 2000, às duas horas da tarde... É um trabalho
que cansa muito mais que escrever ficção.
GZMP - Você já tem idéia sobre o tema
do seu próximo romance?
CT - Tenho uma idéia vaga. Quero escrever sobre
fotografia. Estou comprando livros, pensando e há um esboço
muito tênue de uma narrativa. Mas tenho que deixar amadurecer
ainda.
GZMP - As pessoas não cobram muito a volta do escritor?
CT - Quando elas começam a falar muito, eu digo
que sou um ex-critor. Digo que já tenho obras completas...
GZMP - O seu processo de criação é sempre
assim, lento? Não há rompantes de inspiração?
CT - O processo é sempre lentíssimo. Todas as vezes
que eu comecei a escrever romances com rompantes, não foi
adiante. Não passou da página 5. Eu preciso ter
uma estrutura completa na minha cabeça, para daí
começar a escrever. Agora, o ato de escrever é inspirador.
Normalmente, o livro muda de rumo. Mas eu fico com a estrutura
prévia como uma âncora de salvação.
Se eu me perder, eu volto para ela.
GZMP - Você tem uma mantido uma "média"
regular de lançamentos, um romance a cada um ou dois anos.
Você acha que escreve rápido?
CT - Eu escrevo relativamente rápido. Quando dou
uma "puxada" num trabalho, em cinco a seis meses termino
a primeira versão. Deixo o texto descansar por dois a três
meses, leio, refaço.
GZMP - É o maior crítico de si mesmo?
CT - Sou. Eu nunca estou satisfeito. As vezes pego provas
da editora e tenho vontade de mudar tudo, mas não dá
mais tempo.
GZMP - Você diria que escrever é uma forma de
compulsão?
CT - Eu diria que tenho compulsão com a palavra
escrita. Tenho que estar sempre às voltas com livros, textos.
Não necessariamente escrevendo. Pode ser um trabalho acadêmico.
Eu não consigo me imaginar no mundo sem uma caneta na mão,
sem alguma coisa para fazer. Já fiz dois livros didáticos
com o Carlos Faraco (ex-reitor da UFPR). Uma coisa que eu gosto
muito de fazer. Tem tido uma boa repercussão.
GZMP - Levando-se em conta a dificuldade das duas profissões
que você escolheu, a de escritor e de professor universitário,
você diria que é mais difícil viver das aulas
ou da literatura, no Brasil?
CT - O professor alimenta o escritor. Embora eu tenha seis
livros em "cartaz", pelas editoras Record e Rocco. Sempre
dá um dinheiro extra, mas insuficiente para sobreviver.
GZMP - E, como educador, como você avalia a educação
no Pais?
CT - Eu dou aulas para alunos da elite do ensino superior
no Brasil, que passam no vestibular da Universidade Federal, que
é gratuita - contradição que eu considero
uma tragédia. Eu não vejo que tenha havido uma queda
na qualidade de ensino, ele tem sido mais ou menos semelhante.
Caiu um pouco a qualidade, mas há mais acesso à
informação. Já a universidade pública
está passando por uma chacoalhada violenta. Ela vinha de
um Estado de coisas polarizado. Acabou sendo um baluarte de resistência
ao regime militar. Esta situação mudou, ela precisa
se reciclar. A instituição é lenta, burocratizada,
eventualmente preguiçosa, mas tem, indubitavelmente, o
melhor padrão de ensino do País. Ela tem que sobreviver.
Se o Brasil quiser ter algum futuro na área de educação,
tem que cuidar muito carinhosamente da universidade pública.
Na minha família, ninguém teria se formado se não
fosse a escola pública.
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