Cristovão Tezza: o texto como pretexto
Texto
apresentado no Sixty-Sixth Annual SAMLA
Convention, Savannah, Georgia, em 8 de novembro de 1996.
Monica Rector
University of North Carolina, Chapel Hill
Resumo
Para mostrar que, em Tezza, "o texto é um pretexto
ou pré-texto", usarei dados de três obras
do autor: Uma noite em Curitiba, Trapo e O fantasma da infância,
especialmente desta última. Todas as obras mostram que
a linguagem do romance é a razão principal da
escrita, e que a escrita serve para representar uma realidade,
a brasileira, em particular, mostrando a mesquinhez e mediocridade
humana. Para tentar remediar estes males, o autor escreve ficção
para exorcizar os cancros da sociedade, as diversas" chacinas"
, entre as quais a dos miseráveis sobreviventes. Há
um não conformismo e, ao mesmo tempo, uma impotência
do autor diante dos fatos. Mas falar sobre estes velhos fantasmas
é um processo catártico para o autor, os diversos
narradores e o próprio leitor, numa tentativa de conscientização
do presente e de preservação da memória
do passado.
Abstract
I wiIl demonstrate that in Cristovão Tezza "the
text is a pretext", analyzing three of the authors works:
Uma noite em Curitiba, Trapo e O fantasma da infância,
especially the latter. AlI of Tezza's books deal with the language
ofthe novel being the main reason for writing. This writing
represents a reality, specifically the Brazilian one, revealing
human mediocrity and wretchedness. In order to exorcise these
diseases, the author writes about the several crimes committed
by society, especiaIly the "slaughter" of the miserable
survivors. The author is impotent when he faces these facts.
Writing is a cathartic process for the author, as weIl as for
his narrators and for the reader himself. This is an to mak:e
people conscious of the present, but also to preserve the memory
of the past.
"Eu sou um homem construído pelas
histórias que escrevi".
"Considero o ato de escrever uma aventura ética.
Não posso entender nenhuma obra de arte que não
tenha relação com todo o complexo sistema de valores
que nos rodeiam". (1)
Profundamente curitibano, apesar de nascido em
Lages, Santa Catarina, Tezza é o autor do cotidiano,
da grande cidade moderna, de Curitiba. Diz o autor: "É
verdade: penso que aprendi a olhar o mundo pelos olhos de Curitiba
[...]. Curitiba é uma senhora bastante reservada, dona
de uma timidez, que com freqüência parece excessiva
formalidade, uma cidade muito consciente do seu espaço,
do espaço entre as casas, as árvores e as pessoas".(2)
Mas a sua é uma Curitiba diferente da de Dalton Trevisan.
A diferença com Trevisan é de geração
e contemporaneidade, e, em Tezza, Curitiba serve principalmente
de pano de fundo, um microcosmo para retratar a condição
humana. Tezza diz que a Curitiba trevisaniana "é
uma cidade de natureza mítica", mas é a partir
deste "universo físico e mental estritamente curitibano,
representado em seus detalhes mais comezinhos e provincianos,
que Dalton construiu sua universalidade" (Faraco 20). Cremos,
que Tezza atinge esta mesma universalidade só por outra
via. Diz Mongelli: "O leitmotiv de Cristovão
Tezza é a solidão moral de seus protagonistas,
seres cindidos entre a enormidade dos sonhos, maiores que toda
uma vida, e a estreiteza do dia-a-dia, sucessão de trivialidades.
O descompasso entre querer e poder, entre planejar e realizar
ou entre pensar e dizer traduz-se em hediondas transgressões
às normas éticas e sociais, a repelir os que se
queriam próximos, a provocar o ódio quando se
anseia por amor a guerra em lugar de paz". (3)
Tezza diz trabalhar a ficção a partir
da intuição, mas foi a Universidade e o processo
que realização de sua tese que o ajudaram a resolver
questões de linguagem. A ficção continua
sendo para ele um "quarto escuro": "é
um tiro no escuro: um engenheiro tem plenas condições
de avaliar a qualidade de uma casa ou de uma ponte, um médico
sabe se a operação foi bem feita ou não,
mas um escritor sabe muito pouco sobre o que produz" (Cristovão
Tezza (CT) 26). Por isso, Tezza tenta perfeccionar a escrita
continuamente, fazendo experiências com a linguagem e
com o gênero, que dela faz parte. No texto acima mencionado,
Tezza diz que não publica poemas; abandonou o conto,
e atualmente, só escreve textos com mais de 150 páginas:
"Talvez a grande questão que se apresenta a quem
escreve é descobrir, sozinho, a sua própria linguagem
- o que inclui o seu gênero" (CT 28). Atualmente
o romance é sua forma preferida de expressão.
O romance é como "uma viagem, comprida que nos transforma.
É uma solidão muito povoada, cheia de vozes, teias,
armadilhas e surpresas. É nesse sentido que entendo o
ato de escrever como uma aventura ética, que mexe com
tudo que está em nossa volta, e não apenas o ato
de polir um objeto brilhante que repousa docilmente nas nossas
mãos" (CT 30). Esta aventura com a linguagem, Tezza
também experimenta ao tentar passar sua vivência
aos alunos, como professor de Literatura na Universidade Federal
do Paraná (4), num ensinamento cotidiano que não
tem tempo para ser tão polido quanto a escrita.
Para mostrar que, em Tezza, "o texto é
um pretexto", usarei dados de três obras do autor:
Uma noite em Curitiba, Trapo e O fantasma da infância,
obra que analisarei com mais detalhe. (5) Todas as obras mostram
como: (1) a linguagem do romance é a razão principal
da escrita, e como (2) a escrita serve para retratar a realidade,
em seu caso, a realidade brasileira, denunciando o lado que
gostaria de esquecer, o da mesquinhez humana através
de todos os tipos de violência. Para tentar remediar estes
males, o autor escreve. Esta é sua contribuição:
"Eu sei que escrever ficção [...] é
muito pouco, diante da brutalidade genocida com que os fatos
têm nos presenteado: chacina de menores, chacina de índios,
chacina de presos, sem falar na lenta chacina dos miseráveis
sobreviventes" (CT 36). Há um não-conformismo
e, ao mesmo tempo, uma impotência do autor diante dos
fatos. Falar sobre eles é um processo catártico
para si mesmo, uma conscientização para os demais
e uma preservação da memória, para que
fatos como estes não se repitam.
Uma noite em Curitiba (1995) é um
romance epistolar, com narrativa intercalada. O autor trabalha
certos temas obsessivos, elaborando detalhadamente o perfil
individual de cada personagem. No final há uma surpresa,
o reverso da medalha, como em tantas de suas obras. Trata-se
da paixão de um velho professor, historiador aposentado,
Frederico Rennon, pela atriz de teatro e cinema nacional, Sara
Donavan. É um namoro adúltero, acadêmico
passional. As demais personagens perambulam pela classe média
brasileira de Curitiba. O romance é narrado pelo filho
do professor, após o suicídio deste, que organiza
as cartas do pai, encontradas no computador do falecido. A obra
tenta reviver este romance após 25 anos, para tanto o
narrador tem que reviver o passado, ou seja, historiar a si
mesmo. É uma história da volta do historiador
ao passado, pelos olhos críticos do filho.
Mais uma vez Curitiba, e porque não dizer
sempre Curitiba, é o lugar onde a obra Trapo desenrola
vidas dentro da mediocridade cotidiana. Um professor aposentado
recebe mil páginas de um jovem poeta de 20 anos, marginal
e suicida. Ao organizar este material que a contragosto lhe
cai nas mãos, ele acaba envolvendo-se com as pessoas
que cercavam o poeta suicida Trapo. Esta relação
com seu mundo antigo e este novo, constituem em si um romance.
Há duas isotopias, a narração desordenada
do jovem, sob o efeito de drogas, e a organizada do metódico
professor. Temos, portanto, meta-ficção ou meta-literatura.
O fantasma da infância (1994) é
uma dupla narrativa. Trata da volta de Juliano Pavollini, personagem
principal de uma obra anterior. Diz Tezza: "Porque é
sempre possível fazer uma outra peça diferente
do mesmo livro, com outro ponto de vista adaptar é reescrever"
(CT 33).
O fantasma da infância é a
história de um jornalista decadente André, que
é seqüestrado por um milionário para escrever
sua biografia. Este milionário simboliza a elite corrupta
brasileira na época do impeachment; é um milionário
da economia alternativa, isto é, do mundo das drogas
e do desaparecimento e transformação de carros
em outros carros. Ao redor destes personagens, o autor discute
a realidade brasileira, com descrença no ser humano,
mas com uma disposição bem-humorada diante dos
fatos da vida, talvez com a mesma atitude jocosa do brasileiro
perante as vicissitudes cotidianas. Há duas narrativas:
(1) uma trama policialesca, com suspense: André Devinne,
o advogado profissionalmente bem-sucedido, e pessoalmente bem-casado
com Laura, uma artista plástica, e o pai de Julia. Sua
vida tranqüila vê-se ameaçada com o reaparecimento
de Odair, um velho amigo de prisão em tempos idos, com
segredos guardados a sete chaves envolvendo trapaças,
crime e roubos.
(2) uma narrativa sobre André, um escritor em decadência,
que é abandonado por sua mulher, Laura. Quando André
está falido, o milionário aparece para solicitar
que escreva um livro, sua biografia. Para tanto, com subterfúgios,
o milionário seqüestra o escritor, e o mantém
num recinto fechado, mas bem-atendido por uma jovem secretária,
e com o devido conforto para escrever e para evitar de fugir.
Portanto, temos dois Andrés e duas Lauras. O desfecho
é imprevisível:
(1) André Devinne deixa Odair ficar residindo
em sua casa, por ser pobre e não ter para onde ir. Dentro
da problemática brasileira da cultura dos favores, um
faz o favor de hospedar e o outro o favor de não falar.
Mas a ameaça da presença de Odair toma-se intolerável.
André mata e atira-o num poço no fundo do quintal;
(2) o outro André consegue fugir com o
dinheiro que a secretária Vera, que o vigiava, toma do
patrão dela. Fogem juntos e começam uma nova vida,
num happy-end insuspeitado.
Há, pois, duas narrativas e duas vozes
que se alternam. O conteúdo de cada narrativa mais se
parece a um romance folhetinesco, aparentemente a uma telenovela
de segunda categoria. Por detrás está um jogo
do autor. Os dois Andrés são na realidade um só,
com um desdobramento da personalidade. A personagem sofrera
uma castração na infância, de onde provém
o fantasma, termo este que abrange uma multiplicidade de significados,
como veremos mais adiante. Os dois Andrés são
personalidades doentias. Inicialmente, parecem opostas, mas,
por inserções narrativas e diálogos, vê-se
que as personalidades às vezes se complementam, outras
se sobrepõem até chegar ao ponto em que é
difícil ao leitor distingui-los. Nesse ponto, ocorre
a perda da identidade, que vai se processando lentamente no
decorrer da obra.
Segundo Mongelli: "Se considerarmos que tudo isso é
contado em tom de blague, numa linguagem que mescla muito bem
a simplicidade e o artificiosismo, além do esplêndido
jogo das "vozes" a camuflar a certeira análise
da condição humana, temos confirmada a rara coerência
com que Cristovão Tezza vem construindo sua ascensão
literária. (6)
O primeiro André, o escritor raptado, cria o segundo,
fruto de sua imaginação, que é a personagem
principal no romance que o escritor André está
escrevendo em troca de sua liberdade. O autor, Tezza, é
a terceira voz, tecendo a narrativa. Faz lembrar Luigi Pirandello,
com seus personagens em busca de um autor, enquanto elas - as
personagens - são fantasmas em busca de seu destino,
ele o autor provê o seu porvir através da meta-literatura.
(7)
A escrita é a base da obra ficcional de
Tezza, com a qual experimenta das formas mais variadas. Hábil
ficcionista, o leitor deixa-se envolver pela trama, esquecendo
que esta é apenas um elemento secundário para
o fluir da pena. Se tiver em mente de que "o texto é
apenas um pretexto" para Tezza desenvolver e experimentar
com a linguagem, nada surpreenderá o leitor. Em romances
anteriores, temos a mesma ânsia de libertar-se da precária
e trágica condição humana; personagens
têm diversas crises existenciais, usando a fuga como saída.
No entanto, a saída para este estado está na escrita,
tanto para as personagens como para o autor.
Outra intersecção intertextual no
romance, reside no fato do autor trazer para a O fantasma
da infância uma personagem de uma obra anterior. André
Devinne tem uma falsa identidade, seu verdadeiro nome é
Juliano, personagem que dá o título à obra
Juliano Pavollini, cujo nome já aparecera anteriormente
na obra Gran Circo das Américas. A repetição
da mesma personagem não deixa de ser um fantasma que
reaparece no decorrer das diversas obras. O fantasma da infância
pode ser uma personagem real, como o é Odair, mas são
também fantasmas os da nossa imaginação,
nossos medos recalcados, nossa inocência castrada. Libertar-se
deles, simbolicamente é assassinar Odair, esta sombra
do passado. O outro fantasma "real" é o Dr.
Cid, amigo do pai de André, conhecedor de aspectos íntimos
de sua vida por vê-lo crescer.
Fantasmas são criados ao estar-se só.
A solidão e o isolamento é o espaço do
autor-escritor, nele pode soltar seus fantasmas. A personagem-escritor
é obrigada a se isolar, vive isoladamente, e escreve
isolado. Nesta solidão, o narrador repensa aspectos da
realidade brasileira. Duas narrativas paralelas se entrecruzam
nos últimos capítulos, quando dois finais à
beira do nonsense levam o leitor a melhor entender a realidade
brasileira. Como pano de fundo temos Curitiba e a situação
política da queda do presidente Collor. André
faz parte deste esquema de corrupção, e sua secretária,
com um certo grau de conivência, também pertence
a este quadro. Rouba o dinheiro roubado do advogado e foge para
a Espanha, berço de uma outra democracia a partir de
uma ditadura. A história que estava sendo escrita, no
entanto, fica inconclusa e se abre para outra narrativa: "Se
o Flávio estivesse aqui ia dizer que".(8)
O que Tezza realmente pretende fazer é exorcizar os fantasmas
da história do Brasil, os fantasmas psicológicos
dentro de cada indivíduo, e o fantasma da escrita. Só
pode fazê-lo colocando estes fantasmas para fora, no processo
da escrita. Ao tomar a obra pública desaparece a sombra
do fantasma, porque a obra passa ao domínio público
e já não pertence mais ao autor. Para realizar
isso, o narrador tem que voltar ao útero materno.(9)
O escritor André não conseguia mais escrever,
sua escrita havia secado, só quando é posto à
força num quarto com computador e obrigado a produzir
para conseguir sua liberdade, é realimentado e renasce.
Portanto, o útero materno, simbolizado pelo quarto, é
o espaço da fertilidade intelectual. Ficção
e realidade se alternam, sendo o espaço da "realidade"
mais verossímil do que o da ficção, que
nos parece não só inverossímil (10), mas
parece tratar-se de um nonsense. Podemos dizer, que em O
fantasma da infância há dois tipos de leituras
a se fazer:
(1) uma horizontal, com três narrativas encaixadas (embedded
narratives, mise-en-abíme), são as três
vozes: a de André-advogado, a de André escritor,
a de Tezza-autor/narrador;
(2) uma vertical, com várias isotopias ("níveis
de leitura" na concepção de Greimas): a da
realidade brasileira, a da realidade política brasileira
naquele momento, a do curitibano representando cada indivíduo
em seu dia-a-dia medíocre;
(3) um fio narrativo permeia tanto as leitura horizontal como
a vertical: (a) a linguagem escrita do romance e a da meta-literatura
através da narração e de diálogos
que revelam a linguagem oral, sobretudo na fala rudimentar do
advogado, bem-sucedido material mas não lingüisticamente,
(b) a experimentação com a linguagem através
da destruição do gênero, o uso da intertextualidade
com outras obras dentro desta obra e a reintrodução
de uma personagem sua de uma obra anterior. O que à primeira
vista parece nonsense, na realidade é hiper-realismo,
a ficção parecendo mais real do que a própria
realidade.
Segundo Lima, "estamos no ambiente de uma
fotonovela sofisticada fantasiada de romance psicológico
pré-fabricado, com entremeios de lirismos de matéria
plástica". Creio que o que o autor está tentando
fazer é eliminar a fronteira entre a chamada "literatura
culta" e a "literatura de massa". Estes dois
termos, assim como best-seller e folhetim podem ser intercambiáveis,
como diz Muniz Sodré. A literatura de massa não
precisa ter nenhum suporte acadêmico, a sua produção
e consumo são um jogo econômico do mercado. O talento
de um escritor à míngua, passa a ser uma demanda
do próprio mercado. Sua escrita renasce a partir do momento
que houve um mercado, ou melhor, um mercador. A obra às
vezes se assemelha ao folhetim, porque inclui a atualidade informativo-jornalística
da realidade social brasileira. "Balzac é também
repórter do todo social" (Sodré 13).
Tezza mantém todos os ingredientes de um
romance folhetinesco: (1) o herói, personagem principal,
é retratado como um anti-herói pela falta de grandeza
de caráter e pelos seus feitos grandiosos ao revés;
(2) as façanhas: a luta contra os monstros, aquele fora
dele (Odair e a dificuldade de escrever, referente aos dois
Andrés) e o dentro dele (os fantasmas do passado e da
castração), e (3) o enigma e o deciframento do
mesmo. No romance policial precisa-se da identificação
de um sujeito "criminoso": identificar e punir alguém
que rompeu o ordenamento jurídico, ameaçando a
ordem social, terminando na identificação e na
prisão do culpado. Em Tezza há a identificação
pela perda da identidade, transformando os dois Andrés
num só sujeito. Tezza, portanto, elabora uma matriz,
que pode ser lida horizontal e/ou verticalmente.
Em termos de intertextualidade, podemos ler a
escrita de vários autores em Tezza. Optamos apenas por
algumas em língua portuguesa: Em Os Lusíadas,
Camões aproxima o plano terreno do divino na ilha dos
Amores quando as ninfas se encontram com os portugueses, elevando-os
à categoria de deuses pelos seus feitos; em Tezza temos
dois planos, as duas vozes que se fundem numa terceira, a do
autor, que mantém a sua hegemonia perante suas personagens.
Em O Alienista, Machado de Assis transforma a sanidade
de Simão Bacamarte em loucura. Este coloca toda a população
na Casa Verde, e, só ao realizar o revés (soltar
todos e colocar-se dentro) é que a noção
de loucura / sanidade pode ser rediscutida como a realidade
do outro. Em Tezza, há o André aparentemente sadio,
e o André louco devido a certos atos que comete. Qual
dos dois é são? Bacamarte tem as duas facetas,
os Andrés são um só no final, também
contém ambos os lados. Se analisamos o estado psicológico,
os fantasmas podem ser colocados de qualquer lado como produto
da imaginação. (11)
Nestes três romances, o narrador apresenta-se entre cínico
e irônico, entre o ato criativo e a própria vida
e sua representação. A escrita acaba por ser a
personagem narradora, o texto serve apenas de pretexto.
NOTAS
(1) Elizabeth Orsini. "Um autor para a Bienal
consagrar". Jornal do Brasil. 29 ago. 1991. Caderno B.
In: Cristovão Tezza p.16.
(2) Entrevista com Carlos Alberto Faraco. "Diálogos".
In: Cristovão Tezza, p.19.
(3) Lênia Márcia Mongelli. O Estado de São
Paulo, 20 out. 1990. In Cristovão Tezza p. 44.
(4) Elizabeth Orsini. "Tezza e os Fantasmas de Curitiba".
O Globo. Cad B 21 ago. 1994.
(5) As outras obras de Tezza são:
Gran Circo das Américas. São
Paulo: Brasiliense, 1979. É um livro que poderia ser
considerado um romance juvenil. É a história do
jovem Juliano que foge da autoridade do tio. O autor privilegia
o diálogo.
A cidade inventada. Curitiba: Cooeditora,
1980. É um livro de contos onde predomina o fantástico
e o simbólico. Lembra Jorge Luís Borges a quem
dedica o último conto "Os sábios". O
tema central é a desumanidade da cultura, o que produz
a fuga das personagens em busca de uma saída para a vida.
O terrorista lírico. Curitiba: Criar
Edições, 1981. Trata da incapacidade de relacionamento
dos seres humanos a partir do terrorista Raul Vasques, que destrói
a cidade, símbolo da civilização degenerada.
Obra escrita em primeira pessoa, em forma de diário.
Ensaio da paixão. Curitiba: Criar
Edições, 1982. É uma recriação
ficcional da experiência comunitária e de teatro
popular de Tezza, na década de 60 e 70. O tema da escrita
já começa a preocupar o autor. A personagem, o
escritor Antônio Donetti, luta com sua própria
insignificância.
Aventuras provisórias. Porto Alegre:
Mercado Aberto, 1989. Trata de personagens desajustadas na sociedade,
que têm a opção de se salvar ou perder.
Pablo se perde, mas antes de fazê-lo pede ao amigo para
escrever sua história, o que seria um projeto de vida.
Juliano Pavollini. Rio de Janeiro: Record,
1989. Trabalha com a voz da personagem, que é a voz da
consciência social, essência da substância
humana, mas também de sua individualidade.
A suavidade do vento. Rio de Janeiro: Record,
1991. Trata de um indivíduo que vive a partir do olhar
do próximo e do julgamento do outro. Lembra Machado de
Assis nos contos "Teoria do Medalhão" e "O
espelho". Apresenta a estrutura de uma peça dramática
com Primeiro e Segundo Ato, e Cortina, ou seja, há uma
abertura-prólogo e um desfecho-cortina. Trata-se de um
professor do interior, Josilei Maria Matôzo, que vive
num quarto que ele povoa de monstros, enquanto escreve seu livro,
consultando o I Ching e lendo A paixão segundo G. H.
de Clarice Lispector. Ao publicar o livro, concede uma entrevista
repleta de mentiras, que lhe causam problemas no povoado. Conscientiza-se,
então, de que só quando negar tudo, até
o próprio livro, é que este passará a existir
por si só.
Breve espaço entre cor e sombra.
Rio de Janeiro: Rocco, 1998. É o "drama do pintor
em busca de um caminho no mundo das artes, esmagado pelos tormentos
cotidianos e metafísicos de sua condição"
(André Seffrin. "Cristovão Tezza volta a
falar da relação entre criação e
cotidiano". Jornal do Brasil, 16 maio 1998). A partir da
cena do enterro de um ex-amigo e ex-mestre do narrador, desenvolvem-se
acontecimentos inusitados que terminam numa espécie de
festa "surrealista".
(6) Lênia Márcia Mongelli. "Romance
tem duplo enredo com um só protagonista". O Estado
de São Paulo. Especial Domingo. 4 set. 1994.
(7) Alécio Cunha. " O Fantasma da Infância
projeta Tezza". Hoje. Cultura. Belo Horizonte, 26 set.
1994: 1.
(8) Miguel Sanches Neto. "A dupla vida de André
Devinne. Gazeta do Povo. Curitiba, 20 out. 1994:6.
(9) Carlos Emílio Corrêa Lima. "Um romancista
no cativeiro". Jornal do Brasil. Idéias. 8 out.
1994.
(10) Bernardo Ajzenberg. "Relato sublime sobre os fantasmas
do tempo". Folha de São Paulo, 9 out. 1994.
(11) A intertextualidade com Machado de Assis também
pode ser vista através de Memórias póstumas
de Brás Cubas e Memorial de Aires.
Referências bibliográficas
Cristovão Tezza. Série Paranaenses
n.5. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 1994.
Sodré, Muniz. Best-seller: a literatura de mercado.
São Paulo: Ática, 1985.
Tezza, Cristovão. Uma noite em Curitiba. Rio de
Janeiro: Rocco, 1995.
----Trapo. 5a.ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1995.
---- O fantasma da infância. Rio de Janeiro: Record,
1994.
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