O CONTINENTE
Suplemento cultural do governo do Rio Grande do Sul
Ano I, nº 1 - novembro de 1988


Trapo

Liliana Reales

Nas frias e cinzentas ruas de uma cidade do subdesenvolvimento, Curitiba, um adolescente metido a gênio e, evidentemente, poeta, perambula com assustadoras razões definitivas, tão definitivas como só podem sê-lo as razões adolescentes. Uma Magnun o acompanha. Com ela, o jovem dá um tiro na cabeça num sórdido quarto de pensão.

A tragédia de Trapo, do escritor catarinense Cristovão Tezza, recentemente lançado pela editora Brasiliense, traz de volta, para recolocar com muito sarcasmo, peças irresistíveis - como a luta geracional, a luta de classes, a sofrida passagem do adolescente à vida adulta, o amor impossível, a desesperança existencial, o sentido da literatura e da própria vida - de um jogo armado que se curva sobre si mesmo para começar onde termina, ou vice-versa.

Esta idéia de romance-círculo, o autor de Trapo maneja com segurança de jogador experiente, assim como a metaliteratura, pois Trapo é um romance sobre literatura. Com uma ausência total de pieguismo e um tratamento quase onettiano das personagens, Tezza distancia-se pudicamente de suas criaturas. Mas, ao contrário de Onetti, a palavra de Tezza é propositalmente carente de beleza, assim como as medíocres vidas que povoam o livro.

As vozes narrativas que conduzem o romance, a de Trapo e a do professor Manuel - um viúvo solitário e de suspeita competência profissional a cujas mãos vão parar as caóticas páginas escritas por Trapo - permitem ao autor um cativante exercício da fealdade escrita numa linguagem oral despida de qualquer lance súbito de poesia e beleza. A emoção fica por conta das sutilezas. Ou por conta do avesso. E também por conta de esse voltar a reconhecer as "pequenas" tragédias adolescentes, explosões isoladas num Sistema, como diria Trapo, de uma mesquinidade irresistível.

Trapo é o quinto livro publicado de Cristovão Tezza residente em Curitiba há vários anos e onde trabalha como professor de língua portuguesa na Universidade Federal do Paraná. É o seu primeiro livro a ganhar difusão nacional e já registra sucessos de vendas nas principais cidades do centro do país.
Escritor compulsivo, Tezza prepara-se para lançar, ainda este mês, Aventuras Provisórias, que recebeu o segundo lugar no Concurso Petrobrás de Literatura e para 89 já tem garantida a publicação de seu novo romance Juliano Pavollini, pela Brasiliense.



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