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Jornal da Tarde
São Paulo, 3 de setembro de 1988.
Sem grandes pretensões. Mas envolvente.
Afrânio M. Catani
A Brasiliense acaba de lançar pela série "Circo
de Letras" o romance Trapo (208 págs.), do
curitibano Cristovão Tezza. Embora tenha publicado vários
livros (O Terrorista Lírico, a Cidade Inventada, Gran
Circo das Américas, Ensaio da Paixão, Minha Mãe
e Outras Mulheres), o autor é praticamente desconhecido
do público paulista, pois acredito que seus trabalhos mereceram
edições locais e uma distribuição
deficiente impediu que chegassem às principais livrarias
do País - o que, diga-se de passagem, é de lamentar,
em especial se forem semelhantes a Trapo.
Com um Posfácio de Paulo Leminski, Trapo narra a
história de um "poeta maldito" de 20 anos, "um
suicida que deixa um amigo bêbado, uma paixão misteriosa,
e mil páginas inéditas, que vão parar nas
mãos do professor Manuel, um viúvo solitário
e arredio". Alternando as cartas e poesias de Paulo Trapo
com as reflexões e o monótono cotidiano do professor
Manuel, Tezza escreve um romance agradável de se ler.
A ação se desenvolve em Curitiba, no ano de 1979.
Manuel, cerca de 55 anos, depois de ensinar literatura no secundário
e na Universidade Federal do Estado por mais de trinta anos, está
em casa lendo e desfrutando a merecida aposentadoria. Viúvo,
sem filhos, reside numa velha casa no centro da cidade. Organizado
e metódico, sempre telefona para a mãe (que tem
80 anos) e a visita em Paranaguá. Sua rotina é quebrada
numa noite, ao baterem à pota, logo "depois do Jornal
Nacional, quando desligo a televisão e volto para meus
livros, para as sutilezas da literatura e da lingüística".
De maneira semelhante ao filme Violência e Paixão
(1974), de Luchino Visconti (1906-1976), sua casa e vida são
literalmente invadidas por Izolda Petroski, "uma mulher vulgar,
de cabelos pintados, maquiagem carregada e uma calça apertada
no traseiro", dona de uma pensão familiar. Izolda
carrega dois enormes pacotes, contendo os escritos de Trapo (que
se suicidou em sua pensão), na esperança de que
Manuel publique o espólio do jovem poeta. A intenção
inicial do professor é a de se livrar logo de Izolda e
da papelada do suicida - papelada essa repleta de palavrões,
atentados à gramática e ingenuidades juvenis.
Aos poucos, porém, Manuel vai mergulhando nos textos, vai
se envolvendo, visita os lugares que ele freqüentava, conversa
com seus colegas de noitada, conhece o rico pai do escritor inédito
e chega a um entrevero com os pais de Rosana, a musa do poeta.
Influenciado por Hélio, Leninha e Luci (amigos de Trapo),
Manuel começa a escrever um romance sobre o affaire, um
romance sobre literatura. Leminski afirma no Posfácio que
Trapo guarda influências de Bukowski, John Fante e Dalton
Trevisan. Além disso, percebe-se que Tezza tem grande habilidade
narrativa, produzindo um romance bem escrito, sem grandes pretensões
e que envolve por completo o leitor - embora se pudesse, sem prejuízo
ao texto, encurtá-lo aqui e ali, retirando algumas gordurinhas.
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